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Microplásticos: a ameaça invisível que os cientistas de Maricá estão enfrentando
21 de Outubro de 2025 por Luiz Guilherme Dib

Foto divulgada pelo: istockphoto
Pesquisadores do Projeto Lagoa Viva identificam partículas plásticas nas lagoas de Maricá e alertam para os riscos à biodiversidade e à saúde humana
Eles são invisíveis a olho nu, mas estão por toda parte na água, no ar e até nos alimentos. Os microplásticos, fragmentos de plástico com menos de 5 milímetros de diâmetro, tornaram-se um dos maiores desafios ambientais do século XXI. Em Maricá, essa ameaça silenciosa está sendo levada a sério pelos pesquisadores do Projeto Lagoa Viva, que investigam a presença e o comportamento dessas partículas no sistema lagunar do município.
“Meu interesse pelos microplásticos surgiu a partir dos estudos sobre poluição difusa em água e sedimentos, um tema que se conecta fortemente à questão dos resíduos plásticos”, explica Joel Junior, engenheiro ambiental, mestre em Biogeoquímica e doutorando em Geociências pela Universidade Federal Fluminense (UFF). “Apesar de discretos, esses fragmentos têm um papel significativo na dinâmica de contaminantes e na saúde dos ecossistemas.”
O que são microplásticos?
Os microplásticos podem ser primários, quando produzidos intencionalmente nesse tamanho como pellets industriais, esferas de cosméticos e fibras sintéticas , ou secundários, quando resultam da fragmentação de plásticos maiores descartados no meio ambiente.
Eles chegam às lagoas, rios e oceanos principalmente pelo descarte incorreto de resíduos, lavagem de roupas, desgaste de pneus e escoamento de esgoto sem tratamento. Trata-se de uma poluição quase invisível, mas de rápida disseminação e difícil controle.
Impactos nos ecossistemas e na saúde humana
Essas partículas são ingeridas por organismos aquáticos desde o zooplâncton até peixes e aves , podendo causar bloqueios intestinais, sensação falsa de saciedade e até a morte. Além disso, funcionam como esponjas químicas, acumulando metais pesados e poluentes persistentes que entram na cadeia alimentar.
Pesquisas internacionais já encontraram microplásticos em sal de cozinha, água potável e alimentos do mar. “Estudos indicam que uma pessoa pode ingerir, por ano, o equivalente a um cartão de crédito em microplásticos”, alerta Joel. “Já há registros dessas partículas no sangue humano, na placenta e até no leite materno.”
A realidade brasileira
No Brasil, o combate a esse tipo de poluição ainda enfrenta obstáculos. A ausência de legislação específica e a falta de infraestrutura de saneamento tornam o cenário mais desafiador. Apesar do Plano Nacional de Combate ao Lixo no Mar citar a redução de plásticos de uso único, a integração com políticas de gestão de resíduos e recursos hídricos ainda é insuficiente.
“Precisamos de uma abordagem nacional, com mais dados científicos, padronização de métodos de análise e incentivo à educação ambiental”, defende o pesquisador.
A resposta do Projeto Lagoa Viva
No Biocentro do Projeto Lagoa Viva, laboratório de referência em monitoramento ambiental, os cientistas realizam coletas em água, sedimentos e organismos aquáticos para análise de microplásticos. O material é triado com auxílio de microscopia e técnicas avançadas de espectroscopia (como FTIR e Raman).
“Nossos resultados preliminares confirmaram a presença de microplásticos na Lagoa de Maricá, especialmente fibras sintéticas e fragmentos”, relata Joel. “As maiores concentrações estão próximas a canais urbanos e pontos de acúmulo de lixo.”
Os dados obtidos estão sendo transformados em artigos científicos e servem de base para ações de gestão pública, como controle de efluentes, reforço na coleta seletiva e campanhas educativas junto à população local.
O papel do bioinsumo na mitigação
Embora o bioinsumo do Lagoa Viva seja voltado à biorremediação orgânica, estudos sugerem que comunidades microbianas equilibradas podem auxiliar indiretamente na degradação de microplásticos. “Ainda estamos estudando essa hipótese, mas é possível que o bioinsumo favoreça um ambiente mais estável e menos propício ao acúmulo desses contaminantes”, explica o pesquisador.
Um exemplo para o Brasil
Joel destaca que o modelo de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (PDI) do Projeto Lagoa Viva pode ser replicado em outras regiões costeiras do país. “O projeto une pesquisa aplicada, monitoramento constante e articulação com o poder público. Essa integração é essencial para enfrentar desafios ambientais com base em evidências.”
Compromisso com a ciência e com o futuro
“As lagoas fazem parte da identidade de Maricá. Elas sustentam biodiversidade, cultura e qualidade de vida”, conclui Joel. “Preservá-las é garantir o futuro da cidade e mostrar que é possível transformar a realidade com conhecimento, compromisso e ação coletiva.”





